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6 de set. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 6


Estou... Confusa.

Desde o dia em que Ele “falou”, eu comecei a me perguntar se Ele realmente... Pode me ver.

Ou melhor dizendo, como Ele me vê. Digo, será que eu envelheci? Será que ele me vê na forma em que eu morri? Ou será que ele me vê como eu era antes de ter morrido?

O primeiro caso é... Improvável. Fantasmas não envelhecem, certo?

De qualquer forma, o segundo caso... Eu não sei. Não me lembro do momento em que morri, então não sei. Talvez eu tenha sido esfaqueada ou algo assim, mas acho que se fosse o caso, ele estranharia mais. Seria como ver alguém com uma ferida que nunca se fecha.

Seria como... Ver um fantasma...

Será que ele sabe que eu estou morta? Que eu sou algo que não deveria existir?

Eu preciso saber como ele me vê. Eu preciso me lembrar. Daquele dia, daquele momento... Da forma como eu morri... Eu preciso me lembrar... Eu...

Não consigo... Eu me esqueci... Eu... Me esqueci!

Minha própria aparência! Foram tantos anos sozinha, que... Eu me esqueci de como era o meu rosto...

E meu nome? Como era o meu nome? O nome dos meus pais? Meus avós? Meus amigos? Qualquer coisa!

...

Quem sou eu?

12 de ago. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 5

Ele ainda não chegou.

Metade da noite já se foi e Ele ainda não veio. Algo deve ter acontecido. Não... Algo deve estar acontecendo. Não é a primeira vez que Ele se atrasa.

Mas é a primeira vez que Ele se atrasa tanto...

Será que ele não virá? Será que eu vou passar essa noite sozinha? E amanhã? Ele virá amanhã? Ele precisa vir. Eu preciso Dele. Sem Ele, eu...

Passos. Posso escutar o som de passos.

Ele chegou! Ele veio! Graças a Deus, Ele veio!

Preciso ir até Ele. Preciso vê-Lo imediatamente. Temos pouco tempo esta noite, não posso perder mais nem um segundo!

E lá estava Ele.

Seu rosto e suas vestes molhadas de suor, sua respiração ofegante. Cansado como quem correu uma maratona, Ele se encontrava deitado na porta da mansão, de frente para o jardim.

Eu me aproximei Dele preocupada. Parecia que Ele havia fugido de alguma coisa. O que será que aconteceu?

“A lua...”

“!!!!”

“É realmente linda...”.

Ele... Falou! Finalmente! Fui pega de surpresa e não consegui prestar atenção direito, mas eu pude ouvi-la! Eu pude ouvir a voz Dele!

Que felicidade! Que alegria! Todos esses anos, e eu finalmente...

Finalmente...

Finalmente.... Posso conversar com alguém.

Faz tanto tempo desde que conversei com alguém pela última vez. O que eu falo primeiro? Pergunto o nome Dele? Me apresento? Digo “boa noite”?

“Ei...”

Ah. Ele... Já adormeceu.

31 de jul. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 4


Hoje Ele chegou atrasado. Eu já estava ficando preocupada, achando que talvez algo tivesse acontecido, que Ele talvez pudesse ter se machucado...

Que Ele talvez não viesse...

Mas Ele veio. Ele veio e me encontrou, como sempre. Parece estar mais cansado do que de costume, e não trouxe nem mala nem livro, mas Ele veio até mim e se sentou mais próximo do que nunca. Ficamos olhando para o céu pela janela, até que Ele adormeceu.

Sua respiração era suave e encantadora. Ele parecia tão indefeso, tão frágil...  A cada minuto parecia crescer dentro de mim uma estranha vontade de protegê-Lo.

Mas protegê-Lo de que? E como? Eu... Sou só um fantasma. Nem mesmo sei o nome Dele. Não sei nada sobre a vida Dele. Nada desde o amanhecer até o anoitecer.

Ele só é meu por metade do tempo. Só durante a noite. Me pergunto o que Ele fica fazendo quando estou sozinha...

Será que Ele fica sozinho também? E eu sou sua única companhia?

Não pode ser...

Seria bom demais...

23 de jul. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 3

Ele acordou cedo hoje e partiu. Acabei ficando um pouco decepcionada, mas não posso fazer nada a respeito então logo me conformo e volto a fazer o de sempre.

Assombrar minha casa.

Bem, antigamente eu chamava de “andar por aí”, mas aí comecei a me perguntar se o que eu tenho ainda pode ser chamado de “pé” e se eu realmente estou “andando”. E como eu nunca deixei a casa...

Deixar essa casa... Quantas vezes esse pensamento me tentou? Principalmente desde que Ele veio. Morro de vontade (tá bom, o mais próximo disso possível) de segui-Lo toda vez que Ele vai embora, de conhecer mais sobre Ele do que apenas seu gosto por livros de suspense... Mas por alguma razão a única vez em que estive fora desses muros desde que morri foi no meu primeiro dia como fantasma.

O dia em que eu morri.

Desde então, não consegui mais sair. Acho que eu tinha medo de ser encontrada por algum anjo querendo me arrastar para o céu ou sei lá. Não que agora eu ainda me preocupe com isso. Afinal, se existe algum anjo a me encontrar, com certeza é Ele...

Sim... Ele deve ser alguma espécie de anjo. Um anjo só meu. Alguém que se importa comigo e que vai sempre estar lá para mim.

Todas as noites...

6 de jul. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 2

Como todas as noites desde que nos conhecemos, Ele não demora muito para me encontrar. Mesmo nesta enorme mansão, Ele sempre me encontra e logo se senta em algum lugar no mesmo cômodo. E então, de forma meio misteriosa, Ele pega um livro de sua bolsa como quem só veio até mim por acaso e começa a ler até cair no sono.

Assistir a Ele lendo e dormindo são minhas únicas diversões. Às vezes penso em falar com Ele, perguntar o seu nome, mas nunca consigo juntar coragem. Está bom assim. Não quero arriscar perdê-Lo...

É. Acho que me tornei uma daquelas jovens apaixonadas de romances de livros. Só que morta. Por um lado, posso assistir meu amado dormir todas as noites. Pelo outro, eu atravesso paredes.

Não consigo rir... Bem, não tem problema. O mais importante agora é...

“Uwaaa...”

...

Isso foi... Um bocejo? Ele ainda está acordado? Realmente, acho que ainda é muito cedo para começar a dormir, mas como eu vou saber? Não durmo faz tanto tempo... Ainda assim, Ele costuma ficar acordado por mais tempo não? Ele mal terminou de ler um capítulo! Será que está cansado? Me pergunto o que Ele fez hoje a tarde...

Melhor... Me pergunto porque Ele vêm aqui.

Será que Ele realmente vem para me visitar? Não, isso eu tenho certeza, já que Ele sempre acerta onde eu estou... E Ele não parece ser muito mais velho do que eu. Dezesseis, dezessete talvez? Ainda deve ser um estudante. Que tipo de pai deixaria o filho dormir fora todas as noites?

Ou será que Ele é um morador de rua? Não, Ele muda de roupa todos os dias... Talvez Ele esteja fugindo de casa? Também não, nesse caso Ele estaria carregando uma mala maior... Eu acho. Enquanto aos livros? Toda semana é um livro novo, ou mais. E não parecem ser de nenhuma biblioteca pública, não possuem selos nem carimbos...

Quando finalmente me dou conta, estou ajoelhada ao lado do rosto Dele. Uma face dormindo não vai responder minhas perguntas, mas não consigo me controlar.

“Eu queria poder tocá-lo...” Digo em voz alta.

Ele não me escuta. Claro que não...

3 de jul. de 2012

A História de Um Fantasma - Capítulo 1

O que é estar vivo? Respirar, comer e crescer como os animais? Conversar e interagir com as pessoas que te cercam? Meramente existir? 

Amar?

Faz tempo desde que essa pergunta começou a me incomodar. Muito tempo. 

Era apenas um feriado qualquer. Os empregados haviam tirado um dia de folga e meus pais tiveram que sair. Eu iria ficar praticamente sozinha até tarde da noite.

Sim, certamente eu sabia que era perigoso. A mansão era grande e isolada, atraía muita atenção. Mesmo alguns guardas estando presentes, era certamente possível que alguém mais bem preparado invadisse e se aproveitasse da situação.

Infelizmente, isso não me preocupara. Era meramente uma possibilidade, uma hipótese. Melhor, algo que acontecia com os outros, no rádio ou no jornal. Não comigo. Nunca comigo.

Dói lembrar como eu fiquei surpresa e chocada com tudo. Em um momento, escuto um barulho vindo do lado de fora do quarto. Pensando que talvez meus pais tenham chegado mais cedo, resolvo ir cumprimentá-los como uma boa filha.

Em seguida, nada.

Não consigo me lembrar de mais nada depois disso. Ou melhor dizendo, as memórias de meu tempo viva acabam aí. Quando me dei conta, estava lá fora, morta. Meu corpo numa grande sacola preta, uma ambulância barulhenta e meus pais chorando. Já havia anoitecido, o que indicava que pelo menos cinco horas haviam se passado. 

E desde então eu fiquei aqui. Meus pais não suportaram viver na casa onde a filha morreu, mas também não conseguiram demoli-la ou vendê-la. Nem sei se estão vivos ainda hoje. Não sei quanto tempo passou.

Muitas pessoas moraram aqui. Nenhuma podia me ver, mas acho que minha presença não passava despercebida. Em poucos anos, a mansão em que eu cresci e que um dia me abrigara havia ganhado fama de assombrada, e agora ninguém mais a habitava.

Apenas eu. 

Engraçado... Não era como se eu tivesse companhia nos tempos em que estranhos viviam na casa sem saber de mim, mas agora que eu estou realmente sozinha, sinto falta de ter outras pessoas por perto. E acima de tudo, sinto medo...

Não. Eu sentia medo. Mas agora é diferente. Sim, todas as dúvidas e temores fazem parte do passado agora, basta esquecê-las. Está anoitecendo, mas eu não preciso me preocupar mais.

Porque Ele está vindo me visitar...