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23 de nov. de 2011

O Devorador de Maldições - Capítulo 3: Conclusões

Seja lá a origem do poder contido na espada branca, ele não seria suficiente. Seja lá quão forte fosse e habilidoso fosse o guerreiro que a empunhava, ele seria derrotado. Não havia outro destino para quem desafiava as Portadoras.

Aquelas que carregavam em si as mais cruéis maldições, que transformavam lentamente seus donos em  Misérias, meros bonecos sem consciência, tudo em troca de poder. Aquelas que distorciam o coração humano e que logo iriam dar um fim a tudo. Aquelas cujo pavor eu até então não havia verdadeiramente compreendido. As Portadoras representavam a derrota, em todos os sentidos...

Bem, não iria demorar para que minhas crenças se provassem verdadeiras. Além disso, aquelas palavras continuavam a ecoar em minha cabeça...

"Não se preocupe, ela não é capaz de fazer mal algum a ninguém..."

O som das lâminas se chocando começou a se ecoou, me puxando de volta para a realidade. Meus olhos ardiam com a intensidade da batalha, mas fazia alguns segundos que eu não a acompanhava com a mente. O brilho da espada branca parecia estar fraquejando, enquanto a fúria e a força de sua inimiga apenas crescia.

Mas o que mais me chamou a atenção foi o fato de que o guerreiro negro estava se deliciando com o embate. Seu próprio prazer e loucura pareciam escorrer para a espada, e dela para o que com ela entrasse em contato.  A Miséria não era um boneco da Portadora, e sim sua fonte de poder.

Como se esperasse apenas a conclusão do meu pensamento, a batalha se encerrou. No fim, a espada branca perdeu seu brilho e a espada negra se banhou em novo sangue. Eu agora era o único que havia sobrevivido.

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"Ser forte não se resume a ter poder. E por isso não lhe garante a vitória."

5 de nov. de 2011

O Devorador de Maldições - Capítulo 2: Passado (Parte 2)

Ele apareceu repentinamente em nossas vidas, e foi como se sua presença ali fosse natural. Não questionamos suas intenções, seu passado nem seu destino. Apenas aceitamos a nova companhia como se não houvesse mais nada que pudéssemos ter feito.

Bem, os anciões ficaram receosos nos primeiros dias, mas ele logo os conquistou com seu carisma e gentileza. Não demorou para que eu percebesse que grandes mudanças estavam por vir...

Aqueles que pareciam ter perdido para sempre seus sorrisos lentamente começaram a apresentar um estranho brilho nos olhos, como se estivessem vendo a vida pela primeira vez em anos. As crianças ficavam mais alegres perto dele. Havia uma especie de aura pacífica emanando dele.

Depois de dois meses, a vila havia mudado completamente. O ar não parecia mais amaldiçoado e nem parecia que vivíamos exilados. O homem de casaco branco havia trazido consigo algo que eu nunca teria conhecido de outra forma: Esperança. Não sei pelo que, mas era certamente isso...

A única coisa peculiar sobre ele era a espada longa que ele carregava. Em toda minha vida, as únicas armas que havia visto eram aquelas que os mais velhos usavam para caçar. Machados, arcos, facas... Mas nunca uma espada. Pelo menos não como aquela.

A lâmina deveria ter quase minha altura, com um palmo inteiro de comprimento. Mais branca que a neve de inverno, brilhante como só o sol sabia ser. E poderosa, sem dúvida muito poderosa. Imagino que tenha sido por causa dela que os anciões demoraram para acolhê-lo, uma vez que todas as espadas encantadas haviam sido destruídas pelas Portadoras e suas Misérias, mas ninguém ousou perguntar nada a ele. Ninguém exceto eu.

"Está interessado em minha espada garoto?" Disse ele, quando o indaguei. "Não se preocupe, ela não é capaz de fazer mal algum a ninguém. Eu a herdei de meu pai sabe? Ela é como uma guardiã e um tesouro ao mesmo tempo..."

Aquela resposta pareceu deixá-lo triste por um momento, então resolvi não perguntar mais nada no momento. Lembrando agora, me arrependo um pouco, mas ainda acho que foi a decisão correta. Afinal, não tinha como prever que aquela seria a nossa primeira e última conversa.

Na manhã seguinte, o sol não se levantou. Ao invés disso, eu despertei sob um céu tingido de vermelho e preto, acordado pelos gritos de pavor de todos os meus conhecidos.

Minhas memórias daquele momento são muito vagas. Lembro de entrar em desespero e de procurar por meus pais, sem sucesso. Eles não estavam em casa, e estava um caos do lado de fora. Ninguém parecia ser capaz de me reconhecer em meio a correria desordenada, e eu mesmo não me lembro do que fiz após sair. Só sei que quando me dei por mim, o homem de casaco branco estava ao meu lado e os gritos haviam se acabado.

Todos haviam perdido a consciência, e esperavam deitados o impiedoso julgamento. Sim, lembro-me de encarar aquilo como uma punição, como se a "esperança" que nos fora dada era desmerecida, e alguém viera para nos cobrar uma espécie de divida celestial. Eu estava prestes a aceitar meu destino, quando escutei uma voz levemente familiar:

"Me perdoe... Eu deveria ter imaginado que ele viria atrás de mim... Por favor, me perdoe pelo meu erro..." Dizia a voz.

Bem, naquela altura eu já sabia quem estava falando. O invasor, o visitante, o único que poderia ter trazido algo para nossa pacífica vila. Mas quando eu me virei para encará-lo, percebi que ele nem mesmo olhava para mim. Aquelas palavras eram para os corpos no chão. Para aqueles que eu até então pensava que estavam apenas inconscientes.

Mas as palavras seguintes eram claramente dirigidas ao homem que se encontrava parado de pé em meio aos meus antigos companheiros, carregando uma espada escura como a noite e molhada em sangue.

"Não pense que escapará dessa vez."

Mal consegui piscar meus olhos e a batalha havia começado. A espada colossal e brilhante parecia dançar com a beleza e elegância de um anjo, martelando sua oposta vermelha e negra, que difundia sua cor no céu.
Cada ataque parecia ser capaz de derrubar montanhas, cada corte era tão preciso quanto a mais precisa das flechadas. E mesmo assim, o inimigo parecia não recuar.

Aquilo era um monstro. Se a espada brilhante e seu guerreiro branco possuíam uma aparência divina, o oponente era o inferno incarnado, a morte errante. Foi como se minha mente tivesse finalmente entendido o que meu coração havia imediatamente compreendido. Aquele homem não era humano. Aquela espada não era normal, e aquele poder... Era inigualável. Aquilo só poderia ser uma coisa. Uma Portadora e sua Miséria.

Não tive tempo para me perguntar sobre as lendas que escutei desde criança, porque o que eu via era de certa forma muito diferente. Não, eu não conseguia desviar os olhos do que estava a minha frente. E também, não havia necessidade. Mesmo sem experiência nenhuma em batalhas, pude sentir: Aquela se aproximava de um fim.

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"Felicidade nenhuma tem fim se nos dedicarmos corretamente a resolver nossos problemas."

3 de nov. de 2011

O Devorador de Maldições - Capítulo 1: Passado (Parte 1)

De acordo com os anciões, fazem quase quatro séculos desde o fim da era dos heróis. Todas as espadas lendárias do passado foram destruídas pelas onze Misérias e suas Portadoras no final dessa era, e até hoje nosso continente não conseguiu se recuperar. Uma vez que as Portadoras transformavam seus donos em Misérias e davam a eles corpos imortais e poderes inigualáveis, nunca houve esperança para herói algum. E agora, o povo é obrigado a apenas aceitar a infelicidade eterna.

Bem, eu nunca concordei com eles. Talvez porque eu era muito infantil na época e não entendia tudo aquilo, talvez porque eu nunca havia visto uma Miséria, uma Portadora ou um herói. Mas neste momento, eu finalmente obtive minha certeza.




Minha vida toda eu morei em uma pequena vila cercada pelas montanhas, em um lugar seguro do continente. Bem, digo isso apenas porque nenhum daqueles chamados Misérias e suas Portadoras haviam jamais se aproximado dali. A vila ficava em um lugar horrível, próximo das regiões da floresta onde habitavam ursos e lobos. Sempre tive uma vida difícil, mas fui educado a não reclamar. Diziam-me que era uma benção termos "apenas" lobos e ursos como visitantes...

Tirávamos o necessário para viver da terra e dos rios, mas mal conseguíamos alimentar nossas crianças e idosos. Respirávamos o ar poluído por uma maldição antiga, e sofríamos por pecados que nunca cometemos. Mesmo assim eles ousavam dizer aquela palavra: "Benção".

Isso criou minha primeira imagem, meu primeiro medo das Misérias. Se realmente existia algo tão terrível que faria aquilo tudo parecer uma benção aos olhos dos sábios anciões, ele merecia ser temido. Mas logo eu cresci, e como todas as crianças da minha idade, comecei a questionar e a esquecer tais temores.

Então veio a adolescência, e eu comecei a perceber melhor o mundo ao meu redor. Os mais velhos, aqueles que fugiram de além das montanhas, não pareciam ser capazes de sentir felicidade. Isso nunca me passara pela cabeça, mas assim que eu me dei conta desse fato, meu segundo medo das Misérias nascera.

Afinal, aquelas pessoas eram fortes. Eram eles que enfrentavam os ursos e os lobos sem temer dia após dia. que adentravam a floresta por dias e noites procurando por comida. Aquelas pessoas, aos meus olhos de criança, não temiam nada.

Mas agora eu entendia o porque. Um terror que eu nunca poderia imaginar já havia os dominado uma vez, e roubado tudo o que podia de suas pobres almas. Aquelas criaturas que eu temera em minha infância eram reais.

Então, vivi minha vida agradecendo por nunca telas visto. E fui feliz, até aquele dia. O dia em que o homem do casaco branco apareceu.

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"A diferença entre o medo e o terror é que o medo pode ser combatido com coragem."

11 de out. de 2011

O Devorador de Maldições - Prólogo

Então, faz um tempo que eu to pensando em voltar com outro conto, tipo O Rei e o Lobo (adorei escrever aquilo), mas não tinha nenhuma ideia para desdobrar (mesma razão por n]ao estar continuando A Vida Que Eu Sonhava Ter e More Than a Soldier, Less Than a Man), portanto me perdoem se está não ficar muito boa.

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Em uma era antiga, quando os homens ainda dominavam os segredos da magia e dos reinos divinos, nasceu entre eles um jovem promissor, que se destacava principalmente nas artes da forja e da feitiçaria. Seus dons eram inequiparáveis, permitindo-o a alcançar a maestria em uma vasta quantidade de estilos antes mesmo da idade adulta.

Cada uma das espadas encantadas que ele forjava era digna dos maiores heróis, e não havia um homem que ao colocar suas mãos em uma delas não realizou feitos lendários.

Porém, isso pouco interessava ao jovem. Uma vez que sua visão e compreensão ascendiam as dos que o cercavam, tudo o que se passava era óbvio, e portanto comum a ele. Por entender demais, ele perdeu a capacidade de interagir e compartilhar com seus iguais.

Então, ele continuou forjando, a procura do que lhe faltava. Em sua cabeça, as espadas que saiam de sua fornalha eram as únicas companheiras que ele possuía. E mesmo elas, por conta de sua excelência, estavam destinadas a abandoná-lo.

Dia após dia ele dedicava seu tempo aos estudos, a busca por materiais e por novos encantos, forjando cada vez mais poderosas armas. Na idade adulta, ele já não permitia que suas companheiras vivessem mais de um dia, uma vez que estas agora eram tão poderosas que sua mera existência punha em risco a centenas de vidas.

A solidão e o tempo o haviam cegado. Ou melhor, o havia feito entender que ele nunca alcançaria sua resposta. Não importasse quantas espadas criasse, quantos heróis elas por si mesmas criassem, quanto significado seus feitos obtivessem, ele continuaria tão distante e solitário quanto sempre estivera.

E como seu último ato, talvez porque já havia sido dominado pelo cansaço, talvez como um último recurso para realizar seu objetivo, ele forjou treze lâminas. Cada uma com a capacidade de entender o coração de seu mestre e manifestar a força do espírito do mesmo. Dessa forma, mesmo que ele nunca fosse entender o coração de  outra pessoa, aquelas que ele considerava sua única companhia iriam fazê-lo.

Assim, o pobre ferreiro morreu, sem saber que as lâminas que ele havia criado como sua esperança receberiam um dia a alcunha de "Portadoras* da Desgraça".

*"Portadoras" com a conotação de quem traz, não de quem carrega.

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"Não importa o que dizem, apenas tentar compreender o próximo nunca basta. Este se provaria apenas mais um modo de morrer sozinho. O que mais precisamos é nesse processo, sermos compreendidos."