1 de set. de 2010

Crônicas de um espírito - Capítulo 3

Todos nós morremos um dia. Está é uma certeza que podemos ter a partir do momento em que nascemos. A morte do corpo virá para todos. As vezes ela rápida e fulminante, as vezes ela se demora mais do que deveria. Mas não tenha dúvida, o universo é imparcial e justo. É o nosso trabalho esperar e ajudar as almas de nossos irmãos menores quando for necessário.

Daniel estava deitado em sua cama no hospital. Há muitos meses não saia daquele quarto, pois era necessário acompanhamento médico constante no seu caso. Ele já estava se sentindo mal há algum tempo antes de ser levado para o hospital, mas não havia levado os sintomas a sério. Apenas quando teve um ataque cardíaco na academia Daniel foi socorrido e descobriu suas doenças.

Em seu diagnóstico, constavam cirrose medicamentosa e complicações cardíacas resultantes do uso prolongado de anabolizantes. Se ele tivesse demorado mais algumas semanas para ser atendido suas chances de sobrevivência seriam mínimas.

"Graças a Deus..." Pensava Daniel.

Os médicos haviam marcado uma cirurgia de transplante de fígado para Daniel para hoje. Em alguns minutos ele estaria na sala de cirurgias sendo operado. Depois de ser operado e receber alta do hospital, ele planejava voltar para a casa dos pais e viver com eles até arranjar um emprego. O susto o havia convencido a desistir de usar anabolizantes e qualquer medicamento prejudicial a saúde.

Mas o médico havia avisado-o. Graças ao dano no coração, a cirurgia poderia ser perigosa, e ele poderia morrer. Mesmo assim, ele concordou.

"Toda cirurgia é perigosa, e eu posso morrer a qualquer momento mesmo!" Pensava ele.

Depois de alguns minutos, a enfermeira veio buscá-lo no quarto.

"Senhor Daniel? Vou levá-lo até a sala de cirurgias." Disse ela.

"Obrigado." Respondeu Daniel.

Eu os segui pelos corredores do hospital. Pelo caminho, vi vários outros pacientes acompanhados por espíritos como eu. Alguns ficariam ali por dias, talvez meses, até o momento em que finalmente desencarnariam, alguns seriam levados hoje mesmo, e talvez tenha algum que viva por anos agarrado a sua vida, carregando sua efermidade em desespero. Mas isso era escolha deles.

Daniel foi anestesiado e colocado na mesa cirurgica e a operação começou. As horas se arrastavam lentamente enquanto eu esperava o coração dele enfraquecer. A cada minuto os médicos pareciam mais confiantes e hesitantes ao mesmo tempo. A cirurgia estava indo bem e parecia que tudo iria dar certo.

"Eu não vou perder você!" Pensava a cirurgiã.

"Não, você não vai" Disse eu. "A morte é apenas uma travessia, não existe perda real. Não se preocupa, não será culpa sua".

Eu me aproximei do corpo deitado de Daniel e coloquei minha mão em seu peito. Meus dedos atravessaram seu tórax e chegaram ao seu coração. Imediatamente, Daniel sofreu um ataque cardiaco e morreu.

"Agora está tudo bem..." Disse eu para Daniel.

Mas antes de eu conseguir levar Daniel comigo, a cirurgiã interviu.

"O DESFRIBILADOR! RÁPIDO!" Gritava ela.

Os enfermeiros trouxeram o aparelho e ela rapidamente tentou reanimar o paciente.

"Não adianta. Ele precisa ir" Disse eu.

"NÃO COMIGO! NÃO NA MINHA MESA" Gritava ela.

"Não faz diferença. Não é responsabilidade sua" Insisti.

"EU NÃO QUERO SABER! VOCÊ NÃO VAI MORRER ASSIM!" Continuou ela.

Lentamente, eu retirei minha mão do peito de Daniel. Seus batimentos cardiacos voltaram lentamente ao normal.

"Muito bem então. Eu volto outro dia" Disse eu, por fim.

Lucas Rangel Lima

---------------------------------------------------------------------------------------

"Se nós insistirmos, podemos quebrar qualquer pedra que esteja em nosso caminho. Mesmo que isto resulte em uma montanha caindo sobre nossas cabeças"

Nenhum comentário:

Postar um comentário