5 de nov. de 2011

O Devorador de Maldições - Capítulo 2: Passado (Parte 2)

Ele apareceu repentinamente em nossas vidas, e foi como se sua presença ali fosse natural. Não questionamos suas intenções, seu passado nem seu destino. Apenas aceitamos a nova companhia como se não houvesse mais nada que pudéssemos ter feito.

Bem, os anciões ficaram receosos nos primeiros dias, mas ele logo os conquistou com seu carisma e gentileza. Não demorou para que eu percebesse que grandes mudanças estavam por vir...

Aqueles que pareciam ter perdido para sempre seus sorrisos lentamente começaram a apresentar um estranho brilho nos olhos, como se estivessem vendo a vida pela primeira vez em anos. As crianças ficavam mais alegres perto dele. Havia uma especie de aura pacífica emanando dele.

Depois de dois meses, a vila havia mudado completamente. O ar não parecia mais amaldiçoado e nem parecia que vivíamos exilados. O homem de casaco branco havia trazido consigo algo que eu nunca teria conhecido de outra forma: Esperança. Não sei pelo que, mas era certamente isso...

A única coisa peculiar sobre ele era a espada longa que ele carregava. Em toda minha vida, as únicas armas que havia visto eram aquelas que os mais velhos usavam para caçar. Machados, arcos, facas... Mas nunca uma espada. Pelo menos não como aquela.

A lâmina deveria ter quase minha altura, com um palmo inteiro de comprimento. Mais branca que a neve de inverno, brilhante como só o sol sabia ser. E poderosa, sem dúvida muito poderosa. Imagino que tenha sido por causa dela que os anciões demoraram para acolhê-lo, uma vez que todas as espadas encantadas haviam sido destruídas pelas Portadoras e suas Misérias, mas ninguém ousou perguntar nada a ele. Ninguém exceto eu.

"Está interessado em minha espada garoto?" Disse ele, quando o indaguei. "Não se preocupe, ela não é capaz de fazer mal algum a ninguém. Eu a herdei de meu pai sabe? Ela é como uma guardiã e um tesouro ao mesmo tempo..."

Aquela resposta pareceu deixá-lo triste por um momento, então resolvi não perguntar mais nada no momento. Lembrando agora, me arrependo um pouco, mas ainda acho que foi a decisão correta. Afinal, não tinha como prever que aquela seria a nossa primeira e última conversa.

Na manhã seguinte, o sol não se levantou. Ao invés disso, eu despertei sob um céu tingido de vermelho e preto, acordado pelos gritos de pavor de todos os meus conhecidos.

Minhas memórias daquele momento são muito vagas. Lembro de entrar em desespero e de procurar por meus pais, sem sucesso. Eles não estavam em casa, e estava um caos do lado de fora. Ninguém parecia ser capaz de me reconhecer em meio a correria desordenada, e eu mesmo não me lembro do que fiz após sair. Só sei que quando me dei por mim, o homem de casaco branco estava ao meu lado e os gritos haviam se acabado.

Todos haviam perdido a consciência, e esperavam deitados o impiedoso julgamento. Sim, lembro-me de encarar aquilo como uma punição, como se a "esperança" que nos fora dada era desmerecida, e alguém viera para nos cobrar uma espécie de divida celestial. Eu estava prestes a aceitar meu destino, quando escutei uma voz levemente familiar:

"Me perdoe... Eu deveria ter imaginado que ele viria atrás de mim... Por favor, me perdoe pelo meu erro..." Dizia a voz.

Bem, naquela altura eu já sabia quem estava falando. O invasor, o visitante, o único que poderia ter trazido algo para nossa pacífica vila. Mas quando eu me virei para encará-lo, percebi que ele nem mesmo olhava para mim. Aquelas palavras eram para os corpos no chão. Para aqueles que eu até então pensava que estavam apenas inconscientes.

Mas as palavras seguintes eram claramente dirigidas ao homem que se encontrava parado de pé em meio aos meus antigos companheiros, carregando uma espada escura como a noite e molhada em sangue.

"Não pense que escapará dessa vez."

Mal consegui piscar meus olhos e a batalha havia começado. A espada colossal e brilhante parecia dançar com a beleza e elegância de um anjo, martelando sua oposta vermelha e negra, que difundia sua cor no céu.
Cada ataque parecia ser capaz de derrubar montanhas, cada corte era tão preciso quanto a mais precisa das flechadas. E mesmo assim, o inimigo parecia não recuar.

Aquilo era um monstro. Se a espada brilhante e seu guerreiro branco possuíam uma aparência divina, o oponente era o inferno incarnado, a morte errante. Foi como se minha mente tivesse finalmente entendido o que meu coração havia imediatamente compreendido. Aquele homem não era humano. Aquela espada não era normal, e aquele poder... Era inigualável. Aquilo só poderia ser uma coisa. Uma Portadora e sua Miséria.

Não tive tempo para me perguntar sobre as lendas que escutei desde criança, porque o que eu via era de certa forma muito diferente. Não, eu não conseguia desviar os olhos do que estava a minha frente. E também, não havia necessidade. Mesmo sem experiência nenhuma em batalhas, pude sentir: Aquela se aproximava de um fim.

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"Felicidade nenhuma tem fim se nos dedicarmos corretamente a resolver nossos problemas."

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